Sempre imerso em uma confortável simplicidade, mas sem nunca perder a complexidade de suas histórias, Hayao Miyazaki retorna mais uma vez com “O menino e a Garça”, um adorável conto sobre luto, amadurecimento precoce e resiliência.
A trama segue um jovem rapaz que se muda para o campo após ser acometido por uma tragédia decorrente da guerra, e em meio as bruscas mudanças de sua vida ele se vê atormentado por uma garça falante que tenta o atrair para um mundo mágico secreto afim de fazê-lo sucessor de um reino entre a vida e a morte.

Mesmo abordando temas difíceis em um filme que se pretende ser mais leve, o equilíbrio entre os arcos discutidos é feito quase que a perfeição. Conversas objetivas, mas carregadas de sensibilidade, que se desenrolam em um traço animado moderno, mas sem perder a identidade já consagrada do Studio Ghibli.
Mahito, o tal menino do título, carrega em si um tom um pouco mais pesado que os outros personagens, mas que reflete em atitudes objetivas e no bom desenvolvimento de seu personagem. A relação entre o menino e a garça é curiosa por não ser algo tão óbvio quanto eu esperava, eles não são parceiros no sentido mais cru da palavra, mas a união dos dois move a trama de forma que gere o interesse de saber onde aquilo vai findar.

Assim como em todas as obras do Studio Ghibli, a magia aqui é fundamental e carrega simbolismos já vistos em outros filmes do estúdio, mas que aqui é amarrado do início ao fim com a história. Embora Mahito exale um ceticismo, sua reação aos acontecimentos fantásticos reflete em como ele realmente se sente naquele momento de sua vida, o deixando um tanto resistente as coisas fantásticas que ele descobre com o passar dos dias. A garça, ao contrário de Mahito, é um personagem místico a princípio, mas que ganha tons cômicos em suas falas e comportamento em tela, provocando Mahito e o atraindo para seus objetivos. Embora seja uma ave maliciosa e pouco confiável, seu arco não lhe transforma em um vilão ou antagonista, mas a posiciona sabiamente no tabuleiro de personagens, o deixando interessante sempre que aparece, não só em suas falas, mas em seu funcionamento físico, revelando um pouco como sua existência de fato funciona, assim como quase toda novidade que vai surgindo em tela.
Hayao Miyazaki não revoluciona suas técnicas e identidade aqui, mas mostra, mais uma vez, como é um diretor incrível ao fazer um filme que apenas ele pode criar. Uma história simples mas carregada de simbolismos e reflexões sobre como a vida é e o que podemos fazer quando chegamos ao fim de ciclos e momentos que nos moldam como pessoa e marcam nossas vidas para sempre.
O Menino e a Garça estreia dia 22 de fevereiro nos cinemas.
Texto por Emídio Freitas.